top of page
1. Lembranças que não se apagam

Lembranças que não se apagam... Monsenhor Quinzinho era uma pessoa bem humorada, atenciosa e aberta. Gostava de contar as suas piadinhas. Lembro-me que, às vezes, lá na farmácia, eu ouvia gargalhadas gostosas no escritório. Ficava curiosa... Lá estavam o Monsenhor Quinzinho e meu marido contando as suas piadas e conversando alegremente. Era humilde, simples e obediente ao máximo às normas da Igreja. Era um santo que não queria de modo algum, desobedecer a Deus e à Igreja. Suas orientações e conselhos para mim são alicerces que sustentam minha vida espiritual. Era um grande amigo que a qualquer hora que fosse solicitado, atendia com a maior boa vontade e sentia alegria em poder ajudar e orientar as pessoas. Suas palavras eram como as de um pai carinhoso: “Minha filha...” Todos os nossos filhos foram batizados por ele. Naquela época não havia dias marcados para batizados e Monsenhor Quinzinho sempre aceitava o dia que a gente marcava. Certa vez, levamos nossos filhos gêmeos para serem batizados. Era costume a família oferecer docinhos, etc.; e, desta vez, como das outras, convidamos o Monsenhor que sempre aceitava com humildade o convite. E junto aos padrinhos, ficava muito à vontade. Lembro-me dele sentado lá na sala com meu marido, sorrindo e dizendo: “Que Deus abençoe estas crianças e que isto se repita todos os anos”. E não demorou muito tempo, lá estávamos de novo, desta vez, gêmeas iam ser batizadas. E o Monsenhor Quinzinho, sempre bem-humorado, sorria, desejando que aquilo se repetisse todos os anos. Passei uma época de minha vida muito doente e ele me confessava e levava comunhão em casa, me confortando e ajudando-me a encontrar essa força infinita em meu coração que é Deus. Como já disse, seu desejo era ajudar sempre. Acho que tão grande esse desejo que, certa vez, se comunicou comigo em sonho. Um sonho que muito me impressionou: Eu estava me confessando com ele, no confessionário. Depois de me ouvir atentamente, ele me deu a seguinte penitência: Foram suas as palavras: “ Minha filha, reze 7 Ave Marias à Nossa Senhora, todos os dias de sua vida e mais vezes por dia, se puder. Nossa Senhora vai curá-la, por meio destas 7 Ave marias” Ao sair do confessionário, ele me entregou uma criança que estava em seus braços. Uma criança cuja fisionomia jamais esqueci e que até hoje não sei o significado. Só entendi que as 7 Ave Marias que nunca mais deixei de rezar, foram um caminho para a recuperação de minha vida normal. Tenho ainda problemas de saúde, tomo os meus medicamentos, mas vivo como se não os tivesse. Encontro na vida espiritual, a segurança para a minha caminhada. Certa vez, ganhei um terço muito bonito e o levei para que o Monsenhor Quinzinho o benzesse. Deixei com ele lá na sacristia. Quando fui pegá-lo, no outro dia, no papel que embrulhava o terço, estava escrito: “Reze uma Ave Maria para o Padre que benzeu este terço”. Rezo constantemente essa Ave Maria, agora, por sua alma.

     -     A interrogação desapareceu...Meu filho havia sido operado de uma apendicite aguda, supurada. Pegou uma infecção muito forte e rebelde que não cedia, apesar dos antibióticos que tomava, e passava mal. Após o décimo segundo dia, teve que ser operado novamente. Dez dias após a segunda cirurgia, quando os medicamentos já haviam sido suspensos pelo médico, a febre começa a subir de novo e, no décimo segundo dia, atinge quarenta graus. Ficamos apreensivos e até meio desesperados. Será que me filho aguentaria uma terceira operação? Foi o que pensei. Naquele momento, sentada à beira de sua cama olhando o termômetro, comecei a orar. Com o rosto entre as mãos, pedi a Jesus que nos ajudasse, pois o tempo todo nessa crise, estivemos unidos, rezando constantemente; mas, não me lembrei em momento algum das sete Ave Marias daquele sonho. Afinal, Monsenhor Quinzinho mandou que as rezasse pela minha recuperação e agora quem estava doente era meu filho... Mas, com o rosto entre as mãos, naquele momento de oração profunda, ouvi uma voz que me dizia: ”Aquela criança era o seu filho. Reze as Sete Ave Marias”. E ainda: “Era também cada um dos outros filhos quando estiver precisando de socorro e cada membro da família”... No mesmo instante, contei ao meu filho aquele sonho antigo e a revelação daquele momento. E começamos então a rezar com as mãos sobre o abdómen. Rezamos diversas vezes aquele dia, pedindo a Nossa Senhora que suplicasse a Jesus para tirar do meu filho todo o mal que estava causando a ele aquela febre tão alta. Pedimos pelos méritos do Monsenhor Quinzinho. E a febre desapareceu, sem antibióticos, sem medicamento algum, para nunca mais voltar... Só depois de quase trinta anos, Deus me fez compreender o significado daquela criança do sonho, que para mim era uma interrogação. E aquela voz, de quem seria? Deus mostrou-me naquele instante de desespero que, toda pessoa doente, se torna uma criança.

– HCF – Brazópolis – MG

2. Pepita de Ouro

Em 1897, nasceu em Conceição dos Ouros, a maior pepita de ouro que a nossa cidade já ganhou de presente. Ouro que brilhou em nossas mãos durante 50 anos e que brilha ainda com a mesma cintilância, mas sem podermos tocá-lo. Ouro que brilhará para sempre na memória de todos aqueles que tiveram o privilégio de conviver com ele. Pastor de almas. A síntese de sua ocupação e personalidade. Enérgico, quando necessário. A bondade brotava de si em todas as suas atitudes. Seu passo apressado e miúdo cortava as ruas da cidade sempre levando a sua assistência e consolo a todos os que solicitasse. Sempre andava a pé. Nunca o vi sem batina. Nunca o vi irritado. Nunca o vi falar em dinheiro. Não tinha salário. Vivia da contribuição espontânea de seus paroquianos. Sua prática, aos domingos (na minha infância sermão se dizia prática) sempre se começava com as palavras: “Meus caros irmãos”. E todos se sentiam irmãos dele. Sem contar com uma oratória eloquente e empolgante de um Padre profício, sua palavra era envolvente e constante como trabalhador dedicado que acredita nos frutos de sua ferramenta. Pobre e humilde. Pobre por profissão. Humilde por convicção. Percorria as estradas do município no lombo de um cavalo, ciente de que seus assistidos não possuíam recursos para pagar corridas de automóvel. Humilde e zeloso a ponto de se deslocar de sua casa paroquial a qualquer hora pelo simples toque trinado do sino, tocado por uma moça analfabeta que vinha da roça para se confessar nas vésperas do casamento. E o sorriso vinha junto. Padre Quinzinho: Tu és grande. Mais que isso: és um santo.

MCRF 30/06/91

3. Mons. Quinzinho e sua devoção a Nossa Senhora

Mons. Quinzinho e sua devoção a Nossa Senhora

Hoje, 08/10/90, Glória e eu comemoramos o nosso 43º. Aniversário de casamento. Para nós não há momento mais oportuno do que este para reverenciarmos a memória do Monsenhor Joaquim de Oliveira Noronha, o querido Padre Quinzinho, já que o nosso casamento foi por ele celebrado sob os olhares e aos pés de Nossa Senhora Aparecida de quem ele era grande devoto. Sim, Mons. Quinzinho era devoto de Nossa Senhora. Pode-se afirmar que ele era um autêntico “Filho de Maria”. Certa ocasião, (éramos, ainda, recém-casados) o então Cônego Quinzinho bateu à nossa porta, ainda muito cedo, pedindo um favor e explicando: estava havendo uma concentração mariana em Pouso Alegre. Para lá havia seguido a Pia União das Filhas de Maria de Brazópolis, tendo saído bem cedo, de trem. Cônego Quinzinho, que não podia ir pois era domingo, acompanhou a caravana até a sua saída da igreja. Quando já fazia u’a meia hora que o trem havia partido, ele verificou que haviam se esquecido de levar a bandeira da Pia União Paroquial. Zeloso como era e com aquele especial carinho que nutria por Nossa Senhora, procurou um meio de fazer chegar até às mãos das Filhas de Maria, a bandeira que haviam esquecido. Era esse o motivo por que me procurou: pediu-me, com aquela costumeira humildade para tentar alcançar o trem na estação de Olegário Maciel, levando a bandeira em minha caminhonete para entregá-la às Filhas de Maria. Achei que não haveria tempo para alcançar o trem quando a Glória me sugeriu que, se eu fosse até a estação de Renó, seria mais provável alcançá-lo. Percebia-se que Padre Quinzinho desejava que nada faltasse, um detalhe sequer, para que a homenagem à Maria Santíssima fosse completa para felicidade dele – por que não? nossa também e das Filhas de Maria, o trem foi alcançado na estação de Renó, onde houve grande manifestação de alegria por parte das moças, à chegada da bandeira.

Eu era coroinha e gostava de ouvi-lo cantar: “Deus in adjutorium meum intende”!...Parece que ainda ressoam aos meus ouvidos estas palavras com as quais ele iniciava as rezas solenes que começavam no dia 1º. E se prolongavam até o dia 31 de maio, em louvor a Nossa Senhora. O mês de Maria, celebrado na Igreja D’Aparecida, era para ele um ponto de honra. Pontualmente, às 7 horas da noite, ele iniciava a comemoração solene do mês dedicado à Nossa Senhora no seu santuário para onde se dirigia, sempre a pé, desafiando os rigores do inverno intenso desse período do ano. Mais uma prova de seu filial amor à Maria.

Brazópolis, 8 de outubro de 1990 – HJRF – Brazópolis – MG

4.Viveu só fazendo o bem

Padre Quinzinho -  Era assim chamado o nosso querido e inesquecível Monsenhor Noronha, nas saudosas décadas de 30, 40, 50 ... Lembro-me demais daquela época feliz. Padre Quinzinho acompanhou-me dos dois meses de idade, quando me batizou, até aos 16 anos, quando deixei Brazópolis para ingressar na vida religiosa. Hoje, relembrando tudo o que aconteceu naquele tempo feliz, sinto-me verdadeiramente privilegiada! Sim, e não é um privilégio ter nascido para a Vida Cristã pelas mãos sagradas daquele santo sacerdote? E não é um privilégio ter convivido com ele em minha infância e juventude? Naquele tempo (e hoje confirmo) vi o Cristo em nosso meio: Padre Quinzinho era um outro Santo Cura D’Ars, em Brazópolis. E, agora, escrever o quê sobre ele? Seriam volumes, mais volumes e NADA se diria... Mas, com muita vontade de colaborar para a sua beatificação, vou tentar pôr no papel “um retrato” que me ficou gravado na mente e sobretudo no meu coração.

Padre Quinzinho

- Homem de Deus, o Cristo vivo em nosso meio;

- Homem simples, humilde, exageradamente humilde, se é possível se falar assim;

- Homem de fé inabalável, de viva esperança e de muito amor;

- Homem de indiscutível vida ascética, muito austero consigo mesmo, esquecido de si, abnegado, generoso;

- Homem altruísta, cheio de compreensão e bondade com TODOS, sobre tudo com os fracos e com os pobres, de uma paciência a qualquer prova;

- Homem de muita oração;

- Homem sempre alegre e de bom humor, espirituoso, irradiando tranquilidade e paz;

- Homem que, como o Cristo, VIVEU SÓ FAZENDO O BEM.

Numa das praças de Brazópolis há um busto do Padre Quinzinho. Cada vez que passo por lá, ao olhar a estátua, vejo nela toda a sua vida heroica, que está gravada na minha mente e no meu coração.  Padre Santo, mui querido: daí do Céu, continue cuidando desta sua ovelhinha, que deseja e quer seguir as pegadas de seu pastor. São Paulo, 15 de outubro de 1992 - MTFS

5. Garoto - Relato Irmã

Eu acabava de chegar a Brazópolis e fui conversar com Monsenhor sobre o trabalho que iria fazer na paróquia. Apenas iniciamos a conversa, chega um garoto, um coroinha, de seus 7 anos, mais ou menos, e interrompe a conversa para saber se ia haver Missa na roça no próximo mês. Monsenhor, com toda a delicadeza possível, atende o garotinho. Não tendo em mente os dias de missa na Roça, pede ao mesmo que vá buscar o livro de anotações que estava na sacristia, em determinado lugar, explicando tudo muito bem explicado. O garoto sai e daí a pouco volta com o livro. Monsenhor, com maior calma e atenção possíveis, abre o livro e dá ao referido menino, todas as informações, isto é, os lugares, os dias e horários das Missas. Sai o garoto. De repente, volta. Quer saber qual o padre que vai celebrar. Monsenhor pede licença outra vez e com a mesma calma e paciência, abre o livro novamente, com aquela atenção delicada que lhe era peculiar, informa o rapazinho com a delicadeza e bondade de um santo! Você sabe como o Monsenhor sofria com a perna, tinha dores horríveis e andava com dificuldade, e assim mesmo não queria que alugasse táxi para ele. Vinha e ia a pé para não dar despesas para o Asilo, dizia... Certa vez me disse com tom severo que não arranjasse mais táxi para ele pois, quando precisasse, avisaria. Uma tardezinha, Monsenhor me telefona que no dia seguinte iria celebrar em nossa capela umas Bodas Matrimoniais. Explicou que o casal tinha tantos filhos e que eu fizesse o favor de reservar lugar para eles e enfeitasse o genuflexório para o casal. Tudo bem. No outro dia, chega o Monsenhor e me diz logo: “Hoje, eu estou numa prova de fogo! A senhora me chama um táxi e eu lhe agradeço o café, porque preciso fazer um curativo, urgente, acrescentou. Chega a hora da missa, nada do casal aparecer. Uma meia hora depois, chega uma senhora, lá do Querosene, e me pergunta:  “A missa já entrou?” Expliquei-lhe tudo. Ela então disse: “A missa é para mim com o João”.” Onde está o João?”, perguntei-lhe. “ Vem vindo aí atrás”, disse. Monsenhor, cheio de dores, paramentado, esperando, com toda a calma, com toda a paciência. Até que chega o João, muito acanhado, não quer entrar. Depois de muito agrado, consegui que ele entrasse e ocupasse o seu lugar. E os filhos? Não vieram. Apenas veio o caçula de seus 4 ou 5 anos. Peralteou o tempo todo e o celebrante não se perturbou, não se alterou. Monsenhor entra sereno, com toda a pompa e saúda o referido casal com muito carinho. No Evangelho, fez uma homilia que se fosse o presidente da república, não poderia ter sido melhor. Deu toda a atenção possível e imaginável para aquele casal tão simples que já se achava à vontade junto daquele Padre que era como um pai carinhoso e amável. Depois da missa, qual não foi a minha surpresa quando Monsenhor me disse que não chamasse o carro porque aquela senhora o havia convidado para tomar um cafezinho com ela. E lá vai ele, morro acima, pelo trilho coberto de guaxuma e outros matos duros que poderiam ferir, ainda mais, sua perna doente que estava, como disse, numa prova de fogo.

Certa vez, um sapateiro me disse que, viajando, encontrou uma pelica muito fina e macia e a levou para fazer um sapato especial para o Monsenhor Noronha. Fez o sapato que deu certo. Monsenhor gostou muito, não machucava tanto o seu pé, tão sensível que era. Passado algum tempo o sapateiro fez outro par de sapatos, igual ao primeiro e o levou de presente. Pouco depois, um andarilho, que vivia bêbado pelas ruas da cidade, apareceu com o tal sapato. O sapateiro, curioso, lhe pergunta: “Onde você comprou esse sapato?” E ele disse: “Foi o Padre Quinzinho que me deu”. O sapateiro não esperou mais, foi a casa do Monsenhor e lhe perguntou: “Onde está aquele sapato que lhe dei? Esse que o senhor está usando está muito surrado”. O Monsenhor, com a maior naturalidade, disse: “O novo, eu dei, não sei prá quem, que estava precisando.” Assim era o Monsenhor Quinzinho: pobre, evangélico, desprendido de tudo: como a viúva do evangelho, dava do seu necessário.

Monsenhor fazia questão de visitar os doentes. Uma vez faleceu uma velhinha da Vila Vicentina. Uns dias depois, Monsenhor me chama e diz muito sentido: “Irmã, a fulana morreu e não fiquei sabendo”. “O Padre coadjutor deu-lhe a assistência”, respondi. “Sei, Irmã, mas eu gostaria de visitá-la”. Eu disse, comigo mesma: “Monsenhor, me paga!” Dias depois, passando pela Vila Vicentina, vi um senhor sentado na porta e lhe perguntei: “Como está passando?” Ele respondeu: “Estou um pouco resfriado.” Pensei: “Hoje é o dia!” Cheguei em casa e telefonei para o Monsenhor, dizendo: “Sabe, Monsenhor, o fulano está doente”. Ele: “Muito obrigado, Irmã, estou sabendo sim, já estive lá”. Não só tinha estado, mas levado o médico e pago a receita. Monsenhor Noronha era aquele bom pastor que conhecia suas ovelhas e cuidava com carinho, principalmente das mais necessitadas.

Monsenhor Noronha era uma pessoa que nunca falava dos outros. Certa vez, para provocá-lo, um amigo começou a falar de alguém conhecido de ambos e que havia feito coisas que não são dignas de um cristão. E dizia então o tal amigo: “Aquele cara é assim, assim e fez isso e mais isso” e ia discorrendo os horrores daquela pessoa. Virando-se para o Monsenhor, disse: “ É ou não é, Monsenhor?”

Em vez de confirmar, Monsenhor, virou-se para mim e disse com aquele jeito brincalhão que era costumeiro: “Até parece gente de Curitiba, não?”  Pois o tal amigo era de lá. E assim o assunto terminou em riso.

Aí estão: pequenas coisas que revelam grande santidade! São frutos de uma vida santa. “A árvore boa dá bons frutos”, diz a escritura. Mt, 7,17. 6 Sl 1,3 diz que “o justo é como a árvore plantada junto d’água corrente: dá fruto no tempo devido e suas folhas nunca murcham”. Toda vez que rezo esse salmo, lembro-me do nosso santo e querido Monsenhor Noronha.

Irmã MT – Ouro Fino, 23 setembro de 1991

6. Tio Quinzinho

Tio Quinzinho – Com dois anos, perdi minha mãe, fui morar com minha avó. Eu e meu pai ficamos durante 10 anos na Casa Paroquial, pois minha avó morava lá com o tio Quinzinho. Tenho minhas recordações daquele tempo, um pouco vagas: uma vida tranquila, com pessoas bondosas e tranquilas. Foi um tempo muito feliz para mim. Tio Quinzinho, muito manso e bondoso, estava sempre disposto a ouvir as pessoas. Em todos esses anos que lá morei, nunca vi a porta da rua fechada durante o dia. Todos entravam e eram bem recebidos. Havia sempre café e pão para todos e meu tio para escutar os problemas de cada um, e mesmo ajudar, financeiramente, os necessitados. Ele era incrivelmente paciente com todos. Aquilo, às vezes me deixava irritada, e eu não compreendia como ele aguentava determinadas pessoas, que, em minha vaga percepção de criança, iam lá só para se lamuriar e explorá-lo. Mas, ele sempre atendia a todos e jamais eu ouvi uma reclamação sequer por parte dele. Todos saíam de lá confortados, de uma maneira ou de outra. Uma coisa que ele jamais admitiu era que se fizesse mau juízo de alguém. Ele nunca julgava ninguém. Mesmo quando todas as evidências eram contra determinada pessoa, ele não julgava. Deixava passar. Agora, sei que perdoava. O que posso mais dizer sobre ele?  Era uma pessoa comum, como todas as outras pessoas, só que se distinguia por ser muito bondoso, muito paciente, jamais dizia uma palavra sequer contra qualquer pessoa, jamais falava mal de alguém mesmo que estivesse sendo vítima de alguma maledicência (como cheguei a perceber em épocas de política), e era cheio de amor e caridade, coisas que ele tornava naturais em sua humildade marcante, mas que fizeram dele um ser diferente dos outros. Deixou em mim, muita saudade.

7. Ao Monsenhor Noronha

Ao Monsenhor Noronha – Com um amor silencioso, a Comunidade Paroquial de Brazópolis, lembrou os vinte anos de ausência do Monsenhor Noronha. Vinte anos de ausência...ausência-presença, presença de amor, sempre presente! Presente na lembrança dos que têm memória sensível, memória de coração. Presente o Pe. Quinzinho e sempre unido aos que vieram participar da Missa, carinhosamente preparada e concelebrada pelo Monsenhor José Roberto e Pe. Marco Aurélio. Presente e unido aos que não puderam vir, aos que não quiseram comparecer, aos que já o esqueceram... Presente e unido a todos, em Cristo, na Eucaristia, plenitude do Amor! Ah! “Bom Senhor” (assim diziam as crianças) que veio de longe, trazido pela Providência do Pai, para santificar a nossa Terra. Aqui ficou e anunciou, suave e profundamente, com a vida, as bem-aventuranças. Hoje, ouço você anunciá-las, ainda, nas vozes do nosso Coral, com uma força maior do que outrora. Ouço você e fico a rezar, envolta nos sons que vêm das Profundezas do Eterno.

“Fazei, Senhora, que eu seja

Sempre, sempre, sempre, vossa

Sempre, sempre, sempre vossa

Sempre, vossa, até morrer!”

8. A vida do Monsenhor Quinzinho

A Vida do Monsenhor Quinzinho – Foi um padre que sempre foi ligado a Deus. Eu ainda lembro muito bem dele. Quando eu era criança, fiz a primeira comunhão com ele. Lembro das brincadeiras dele, conosco, as crianças, na escola, quando nós fomos comer bolo. Monsenhor Quinzinho foi muito trabalhador. Ele andava a pé ou a cavalo, porque nem  havia carro neste tempo para ele andar. Vinha às roças para confessar os doentes, para celebrar missa. Ele não tinha preguiça. Quando procurasse por ele, já era atendido, com prazer. Ele tinha varizes nas pernas e, nem assim, ele não negava de servir ao próximo. Ele gostava de usar uma batina preta e um chapeuzinho preto. Eu gostava muito dele, porque ele era muito conselheiro. Só gostava de ver as pessoas no bom caminho. Muito humilde, não tinha orgulho, lidava com todas as pessoas, com carinho. Gostava quando alguém procurasse, para qualquer benefício da igreja. Era muito caridoso. Eu me lembro muito bem de um grande tempo da vida dele. Ainda me lembro das missas em latim, que ele celebrava e também confirmo que já tenha alcançado muitas graças através dele. São muitas coisas que eu peço e a alma dele tem me atendido. Para mim, eu acredito que ele é um Santo.

EMN - Brazópolis, 16 de julho de 1992

9. Carteirinha

Alguns dias depois de sua morte, algumas pessoas foram fazer uma faxina em sua casa. E eu, em conversa com um amigo, peguei uma carteirinha, muito pequena. E eu, abrindo, encontrei os seguintes dizeres, talvez fosse um propósito:

1º. Nove meses antes de sua ordenação, ele iniciou uma novena aos Sagrado Coração de Jesus, das nove sextas-feiras, sendo a última coincidindo com a sua ordenação sacerdotal. Isto nos mostra a sua grande devoção ao Sagrado Coração de Jesus.

2º. Que ele haveria de ter muita paciência com as pessoas ignorantes.

3º. Sua vida seria uma vida de meditação e de trabalhos. Ele era muito devoto do S.S Sacramento e de Nossa Senhora. Todas as missas por ele celebradas, ele não saía da igreja, sem antes ir à capela do S.S Sacramento. Só ficava de joelhos por alguns momentos, em Oração. Tinha um amor tão grande a N. Senhora que, ao rezar o terço, sempre rezava aos pés de uma imagem de Nossa Senhora.

Todos esses dados, afirmo e dou testemunho, porque vi com meus próprios olhos.

AIF – Bairro Can-Can - Brazópolis

10. Última visita

Padre Quinzinho – Fui uma das últimas pessoas a visitá-lo em Pouso Alegre, dia 13 de julho de 1971. Nesta ocasião, meu tio Luiz, estava internado no mesmo hospital em que se encontrava o Monsenhor. Eu e minha irmã Nazaré, entramos para vê-lo. Ao nos ver, ficou muito contente, pois o papai, Miguel Mendes, era muito amigo dele. Quase sempre ele o substituía quando da reza do terço na matriz, quando o Monsenhor precisava sair e não podia rezá-lo. Servimos um copo com água que ele nos pediu. Ficamos conversando com ele um longo tempo sobre Brazópolis, mas, nada contamos do tio Luiz. Titio veio a falecer nesse mesmo dia. Foi assim o último contato com ele ainda com vida que eu tive. Infelizmente não pude acompanhar seu enterro. Nesse mesmo dia, nós perdíamos um tio em Borda da Mata. Mas, durante m bocado de anos eu tive o privilégio de conviver com ele lá na tipografia municipal do Jornal “Brasópolis”. Era quando Monsenhor levava para publicação o “Movimento Paroquial” do qual eu era sempre encarregado de compor. Naquele tempo o jornal circulava semanalmente. Ele sempre ficava muito tempo a conversar conosco e dizia – “Gosto muito de vir aqui, vocês são uns “tipos sujos” diferentes”. Os “tipos sujos” era porque o nosso jornal é feito catando letra por letra ou tipos e elas são sujas de tinta de impressão. Era um modo carinhoso de nos dizer o quanto ele gostava de nossa companhia.

Às vezes ele vinha na última hora para que trocássemos um nome na intenção da missa, pois naquela época o número de intenção era reduzido. Ele sempre dizia – “Venho dar trabalho para vocês”, no que eu respondia: “Trabalhar para o senhor, não é trabalho”. –“Vocês são muito bondosos, acrescentava ele”.

Com um sorriso nos lábios, depois de um cafezinho e um cigarrinho de palha e algum papo gostoso, ele se despedia e ia embora para voltar na próxima semana.

Essa troca de nomes na intenção da missa era para ver o respeito e carinho que ele tinha para com os seus Paroquianos.

Para nós da tipografia, principalmente para mim, foi muito gratificante ter tido esta honra de ter convivido com ele tão carinhosamente tanto tempo.

JVM - Brazópolis

Novembro 1987

11. Até logo

Conheci o Padre Quinzinho desde os meus 10 anos de idade quando eu ou uma de minhas irmãs vínhamos buscá-lo para ir até a fazenda Boa Vista, onde morávamos, para atender confissão e administrar o sacramento dos enfermos a uma pessoa. Eu e minha irmã disputávamos essa tarefa pois gostávamos de carregar a sua maleta. Então, combinávamos: uma iria buscá-lo e a outra iria levá-lo de volta. A pé. Padre Quinzinho resolvia a questão: “Vão as duas e voltem as duas”. Nessas ocasiões, era em nossa casa que ele fazia uma parada para descansar da caminhada. Aí, muito amigo de meu pai, Antônio Gonçalves Peixoto, em sua companhia tomava sempre um cafezinho e fumava o seu cigarro de palha. Ele pedia ao papai: “Antônio, me dê um “picadinho” daquele fumo gostoso que você tem aí?” Fazia um cigarrinho e fumava “saboreando-o” e depois colocava o resto do fumo no bolso e dizia: “ Esse é meu”. Ele me dava um cigarrinho já pronto, um cigarrinho fraquinho que eu fumava às escondidas. Papai era seu amigo e muito brincalhão. Ele era magro e alto e, no tempo de menino, usava calça curtas. Padre Quinzinho era 10 dias mais velho que papai e costumava chamá-lo de “Pernilongo”, apelido que ele mesmo colocou em papai, desde o tempo de escola – por causa de suas pernas magras e compridas. Eles foram companheiros desde os primários anos escolares.

Um dia, terminada a missa das 7 e meia da manhã, fomos ao bar do João Machado e, ali, encontramos o Padre Quinzinho que já estava tomando o seu cafezinho. Nessa hora, entra o “pinguço” Zé Sapinho, pedindo ao meu marido: “Ô Zé, me dá um pouquinho de pinga”. Padre Quinzinho interferiu: “Não dê, não, José. Dê-lhe um pastel ou outra coisa qualquer para comer. Pinga a essa hora, não”. O Zé Sapinho não aceitou e foi embora. Padre Quinzinho, também, foi embora. Ficamos eu e meu marido. Tomamos o cafezinho e, quando fomos pagar, o João Machado nos disse: “O café está pago; o Padre Quinzinho já pagou”. Pagou sem percebermos e saiu dizendo: “Até logo”. GPV - Brazópolis

12. Era muito engraçado

Padre Quinzinho era muito engraçado!... Todos os dias, ele passava, quase que “correndinho” em frente à nossa casa. Ora prá cima, ora prá baixo... Batina ao vento...

Quando nós (a meninada) o víamos, a gente corria para a outra calçada porque ele sempre dava um “coque” na cabeça da vítima desprevenida...E, aí..., como doía aquele “coque”... E ele era também meio moleque como a gente porque, muitas vezes, ele nos pegava distraídos, vindo na ponta dos pés para nos acertar com aquele seu coque doído... A gente, pega de surpresa, sentia vontade de gritar aquele palavrão... Mas, como gritar um palavrão para o Padre Quinzinho???... E todo dia aquela brincadeira se transformava em risada...

Nas outras vezes, quando o víamos aproximar, a gente gritava: “Ô, Padre, me dá um santinho?” E ele respondia, todos os dias, metendo a mão no bolso: “Amanhã!...”

Lembro-me de uma passagem, bem moleque, que aconteceu comigo, menina nos meus 9 anos, bem vividos na molecagem da rua D. Ana Chaves.... Eu usava, constantemente, calça comprida, talvez por costume da época ou por gostar, não sei... E o Padre Quinzinho, quando passava, olhava para mim e dizia: “Ô, Zezinho! “... Eu, lhe perguntava, intrigada: “ _ “Zezinho, por quê?”... Ele respondia: “ Porque você está de calça comprida. E, calça comprida, quem usa é homem...”

 Inúmeras vezes esse diálogo se repetiu...até que, um dia, aquela menina de 9 anos que usava calça comprida, se encheu de coragem e safadeza e concluiu o diálogo da seguinte maneira: “ Oi, Zezinho!” “ Zezinho, por quê?” “ _ Porque você usa calça comprida e, calça comprida, é para homem...

Naquele dia,  a petulante menina o abordou dizendo:

“Ô, Mariquinha”, ela disse. “Mariquinha, por quê?” – ele perguntou. “Porque você usa essa saia preta e quem usa saia é mulher...” ela respondeu.

Depois daquele dia, ele nunca mais a chamou de Zezinho...Ele só a olhava com um risinho no canto do olho...

 Mas, os “coques” continuaram... Os gritos pelo santinho eram a uma só voz...e ele era a alegria da meninada que, depois que ele passava, continuava a brincar...

Tenho muito orgulho em poder dizer que o meu livrinho de orações da Primeira Comunhão foi presente dele e está dedicado a mim.

Hoje, aquela menina de 9 anos, já é uma “menina” de 41 anos. Hoje, ela vê no Padre Quinzinho, a presença constante da pureza, pureza de criança... Padre Quinzinho era puro de coração...

RMRFH – Belo Horizonte - MG

13. Um Santo, que um dia viveu entre nós

Mons. Joaquim de Oliveira Noronha – Padre Quinzinho – Um santo, que um dia viveu entre nós, como vigário da Paróquia de São Caetano, celebrando missas na Igreja Matriz, batizando nossos filhos, casando os noivos, enterrando nossos mortos queridos. Até os casamentos realizados na Basílica Nossa Senhora Aparecida - São Paulo, eram realizados pelo Padre Quinzinho, convidado pelos noivos. Ele não media sacrifício, enfrentando a longa viagem. Era uma pessoa simples e modesta, bondosa e extremamente caridosa, dando tudo que possuía aos pobres. Muitas vezes, saía a cavalo, para as roças, atendendo aos doentes, levando-lhes a sagrada comunhão e a extrema-unção. Amigo de todos – ricos e principalmente os mais necessitados. Sua morte, foi uma perda irreparável e o povo chorou, sentindo sua falta. Seu túmulo, no cemitério da cidade, onde repousa o sono eterno, sempre coberto de flores, com velas acesas pelas pessoas que, diariamente, vão orar e pedir-lhe graças.

FRP – Brazópolis

Âncora 1
Âncora 2
Âncora 3
Âncora 4
Âncora 5
Âncora 6
Âncora 7
Âncora 8
Âncora 9
Âncora 10
Âncora 11
Âncora 12
Âncora 13

Paróquia São Caetano

Rua Dona Ana Chaves, nº 199. Centro. Brazópolis/MG

bottom of page